A cada dia tenho mais certeza de que não sou deste mundo. Na festa,
enquanto todo mundo ria, conversa e ri, eu imagino cenários para as personagens
que surgem em minha mente, no momento em que deitado, observo a alegria dos
outros ao redor de mim. Sempre admirei aqueles que sabem dançar e que, naturalmente,
seguem os compassos sem dificuldades. Eu, não. Minha dança não passa de uma
tentativa de movimento desconcertado. Do sofá, ouço a música que os
festejadores dançam. Uns cumprem a coreografia do “vestidinho preto indefectível”;
outros apenas fazem os passinhos que sabem, sem qualquer pretensão. Eu sou
realmente estranho. Todos bebem vinho, eu tomo suco. Eles dançam, eu deito no
sofá e leio poesia. Os outros falam coisas do cotidiano, de paixões, de
política; eu, quieto e calado, imagino poemas, crônicas, contos, crio cenários
e personagens enquanto a energia do momento vai brotando entre nós. Nesses
momentos, lembro muito da pergunta feita por Clarice de que “gastar a vida é
usá-la ou não usá-la”. Aí, questiono se o fato de eu estar deitado pensando e
lendo poesia quando todos os presentes bebem e dançam, é gastar ou não minha
vida. Estou usando-a ou não? Sinceramente, não sei. Só “sinto que não tenho parte
nisso tudo”, e que geralmente “sou feliz na hora errada”. Será que meu modo
tácito de ser também é felicidade? Eu acho que sim. Sou estranho, diferente
talvez. Mas este fato não me torna superior nem inferior os outros. Sou apenas
aquela criatura que não segue o ritmo, mas que tem um modo peculiar de “gastar
a vida”.
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